Mulheres afegãs: O olhar artístico de Masuma Yavari
Há cerca de dois anos e meio uma jovem artista em situação de refúgio, Masuma Yavari, chegou ao Brasil. Trouxe poucos objetos e roupas, e a esperança de construir uma vida com mais dignidade. Ela é uma das muitas afegãs que lutam por mais representatividade e direitos após a tomada do poder pelo Talibã em 2021. Uma jovem que mostra a contradição do sistema pós-intervenção americana e a chegada do governo conservador.
A fotógrafa e pintora embarcou para o Brasil em dezembro daquele ano. Embora o seu coração estivesse com a família no Afeganistão, em meio ao agravamento das restrições crescentes impostas à população, ela se viu impotente e isolada daqueles que ama. Os desafios foram sentidos logo no início da adaptação, e com o passar dos anos, esse sentimento se tornou uma fonte de inspiração e de autodescoberta. As paisagens, a cultura vibrante, o rico patrimônio artístico e o povo brasileiro se integraram à sua personalidade.
Em seu país, ela lamentava a dura realidade das mulheres marginalizadas, e das crianças exploradas. Por acreditar num futuro melhor, participava de um projeto para dar visibilidade a essas mulheres e crianças, um esforço que foi abruptamente interrompido quando proibiram a fotografia. Masuma conseguiu sair do país por meio de uma parceria feita entre o seu professor de fotografia no Afeganistão, o alemão Stefan Dotter, e uma funcionária da Internacional Trade Center (ITC), uma agência da ONU para o desenvolvimento naquele país, a brasileira Sabrina Herzog. Eles possibilitaram a vinda de um grupo de jovens fotógrafos que sofriam perseguição naquele país.
Essa jovem de origem Hazara, uma minoria mongol e turca, que compõe 30% da população afegã, representa um povo que sofre intensa discriminação étnica e tem uma das principais línguas do país: o Dari (persa afegão). Ela é uma artista e fotógrafa que traz um olhar sensível para o projeto do Instituto Estou Refugiado. Além de contribuir para que tenhamos mais informações sobre o seu país de origem, ela luta por igualdade de gênero e pelo fim das restrições impostas pelo Talibã.
Também colabora com a nossa equipe de comunicação com vídeos e fotografias. É uma das várias vozes femininas que lutam por mais representatividade, pelo fim da ditadura do Talibã e do conservadorismo naquela região entre a Ásia e o Oriente Médio. Representa parte das mulheres afegãs que saíram forçadamente de suas casas devido a temores de perseguição, em razão da generalizada violação de direitos humanos e dos conflitos armados.
Aqui no Brasil essas mulheres encontraram refúgio e possibilidade de se desenvolverem plenamente. Masuma defende os direitos das mulheres, luta para mais igualdade de gênero e representatividade não só em seu país na Ásia Central, mas no mundo. Ela é parte de um movimento que está muito forte no Oriente Médio e na Ásia, que questiona as esferas de poder. No país de acolhimento, pode contribuir para a melhoria de políticas públicas dadas aos migrantes internacionais, às pessoas em situação de refúgio, e com isso reforçar a representatividade feminina.
Um pouco mais sobre o país de Masuma Yavari
O Afeganistão, como um Estado, surge em 1823: o Emirado do Afeganistão, sob o controle do Império Durrani (1747-1826), de origem pashtun. Inicialmente a capital era em Candaar, em seguida passou para Cabul. A formação da sociedade contou com a contribuição de diversas tribos da Ásia Central: pashtuns, tajiques, hazaras, usbeques e turcomenos. Portanto, é um país multiétnico, sem saída para o mar, situado ao longo de importantes rotas comerciais que conectam o sul e o leste da Ásia à Europa e ao Oriente Médio.
Tem uma paisagem árida, com desertos e montanhas, com povos independentes e duas línguas oficiais, o pastho e o persa afegão (Dari persa). Essa variedade étnica e cultural ajudou a formar um mosaico de facções concorrentes, com alianças em constante mudança. Isso corroborou para que a região tenha tido uma longa história de dominação por conquistadores estrangeiros e de conflitos entre facções internas.
Da conquista por Dario I, da Babilônia, por volta de 500 a.C., a Alexandre, o Grande, da Macedônia, em 329 a.C., a região sofreu influência de diferentes povos. A história desse país é marcada por avanços e retrocessos na luta por direitos: períodos democráticos, intervenções ditatoriais, guerras civis, liberdades e ocupações.
Na história recente, de 1978 a 1992, teve um governo socialista, comandado pelo Partido Democrático do Povo do Afeganistão (PDPA). Nas últimas décadas houve a guerra do Afeganistão (1979-1989), no contexto da Guerra Fria, a guerra civil (1989-1992), a ocupação do Talibã (1996), a intervenção norte-americana (2001-2021) e o retorno do Talibã ao poder (2021).
Existe grande resistência frente à opressão do Talibã; homens e mulheres estão juntos em defesa do mesmo ideal de proteção de direitos. Apesar das constantes mudanças de governo até a chegada do Talibã, o povo resiste com aproximadamente 5,7 milhões de pessoas vivendo fora de seus países, sendo 5,1 milhões somente no Irã e no Paquistão, segundo dados da Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR).
A história desse país é marcada pela resistência das diferentes etnias, devida ao histórico de conflitos na região. E sendo um país multiétnico, os afegãos trazem artes, histórias e línguas de diversas partes do território para o país de acolhimento.
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